Por Valéria Bursztein
Technibus – Qual é o atual momento da empresa em termos de market share, projetos em desenvolvimento e investimentos? Pode antecipar algum dos projetos em curso?
Iêda Maria A. Oliveira – A Eletra está em um ótimo momento, pois a ideia de eletrificação do transporte público começa a ganhar tração no Brasil, depois de mais de dez anos de inércia. Segundo a plataforma E-Bus Radar, dos 556 ônibus elétricos em circulação no Brasil em junho de 2024, a Eletra produziu 451, o que dá uma participação de mercado de 81%. Dos 5.561 ônibus elétricos em circulação na América Latina, a Eletra participa com 8,1% do total. Todos fabricados no Brasil, em São Bernardo do Campo, com tecnologia nacional. Todos os outros foram importados da China. Somos a única empresa de ônibus elétricos do latino-americano e queremos ser uma das maiores do mundo. Ainda temos muito trabalho pela frente, mas podemos dizer que a Eletra começa a colher os resultados de seu pioneirismo em eletromobilidade e dos investimentos feitos ao longo de 25 anos. Temos hoje a mais diversificada linha de ônibus elétricos do Brasil e da América Latina. São 11 modelos diferentes, adaptáveis à topografia urbana de qualquer cidade brasileira.
O projeto mais recente é o ônibus elétrico escolar – outro lançamento pioneiro, apresentado no C-Move Brasília em março. São duas versões: Escolar Elétrico 9,7m e Escolar Elétrico 11,3m. Temos certeza de que esses produtos darão um grande impulso ao Programa Nacional de Apoio ao Transporte Escolar (PNATE).
Technibus – Quais foram os principais acontecimentos da empresa no ano passado?
Iêda Maria A. Oliveira – Estamos em um processo de crescimento vigoroso especialmente depois do início de operação de nossa nova fábrica de 27 mil m², na Via Anchieta, em São Bernardo, em 2022. Aprofundamos, também, a parceria estratégica com algumas das mais importantes empresas de transporte público e eletromobilidade do Brasil. Nos últimos três anos, nos concentramos em lançar nossa nova linha de produtos – como disse, a mais completa e diversificada do mercado. Especificamente no ano passado, o foco principal foi produzir o e-Trol. Até o final do próximo ano, a Eletra fornecerá 92 e-Trol para a frota do BRT-ABC, uma linha de 18 km que ligará a região do ABC a São Paulo. Será a primeira linha de transporte público em via segregada do Brasil operada exclusivamente por ônibus 100% elétricos.
Technibus – A empresa realizou algum aporte ou investimento recente em expansão, aquisição ou desenvolvimento de novos produtos?
Iêda Maria A. Oliveira – Estamos colhendo os frutos do investimento inicial do grupo ao qual pertence a Eletra na fábrica em São Bernardo do Campo e na nova linha de produtos. Esse investimento ficou em torno de R$ 150 milhões. Nas novas instalações, a Eletra se capacitou a produzir até 1.800 ônibus elétricos por ano. Mas tem condição de ampliar essa capacidade em até 50%, se necessário. Os novos investimentos dependerão de haver perspectivas firmes de aumento da demanda no Brasil.
Technibus – E o que a empresa projeta para 2024 em termos de volume de negócios, investimentos, novos negócios e parcerias?
Iêda Maria A. Oliveira – A meta principal da Eletra no segundo semestre de 2024 é abrir uma nova frente de negócio com os ônibus elétricos escolares e ajudar a impulsionar o Programa Nacional de Apoio ao Transporte Escolar. Mas, é claro, estamos fortemente empenhados em consolidar nossa posição nas cidades brasileiras que já iniciaram programas de transição de frotas. Um dos fatos mais importantes de 2024 foi o anúncio do governo federal, em maio, via PAC Seleções e BNDES, de financiamento de R$ 10,5 bilhões para renovação de frotas de ônibus em 98 municípios brasileiros. Dos 5.350 veículos que serão financiados pelo PAC, 2.529 serão ônibus elétricos. A Eletra, é claro, está trabalhando fortemente para apresentar seus produtos a esses municípios e oferecer soluções seguras e eficientes para a eletrificação de frotas.
Technibus – Qual a opinião da empresa sobre o atual momento do seu segmento de atuação?
Iêda Maria A. Oliveira – Ainda estamos no início da transição rumo à eletromobilidade no transporte público no Brasil. Esse processo teve dois momentos importantes: O primeiro foi a Lei 16.862, de fevereiro de 2018, que fixou metas anuais e um prazo de 20 anos para a troca dos 13 mil ônibus a diesel da cidade de São Paulo por veículos de baixa emissão. Esta lei começou a organizar a cadeia produtiva nacional de ônibus elétricos, mas ainda está sendo aplicada num ritmo muito lento, por vários motivos. Temos de acelerar essa transição. Hoje, temos mais ou menos 350 ônibus elétricos em circulação em São Paulo, incluindo os trólebus. A meta desse ano era chegar a 2.400. Outro momento importante foi o anúncio do PAC Seleções, em maio. Serão contemplados nesta primeira fase 2.529 ônibus elétricos. Entendo que ainda é um número muito tímido. Mesmo com todo o esforço realizado pelo setor, ainda temos pouco mais de 20 municípios brasileiros com programas firmes de eletrificação de frotas. É muito pouco. A frota total de ônibus urbanos no Brasil tem 106 mil veículos. Portanto, temos ainda muito trabalho e um longo caminho pela frente.
Por fim, entendo que cabe ao governo dar segurança e previsibilidade nas regras do jogo para consolidar a cadeia produtiva nacional de ônibus elétricos. São empresas brasileiras, que já operam há muitos anos no país e podem oferecer aos clientes a segurança de assistência técnica e reposição em território nacional. Para isso, as autoridades não podem cair na tentação de abrir indiscriminadamente o mercado à importação de ônibus elétricos, comprometendo os investimentos das empresas brasileiras. É preciso ter visão estratégica e dar os passos certos. A consolidação da cadeia produtiva nacional de ônibus elétricos no mercado brasileiro criará as condições para que essas empresas passem a atuar no mercado internacional e se tornem players globais em transporte sustentável.