Technibus – Como o GVBus encara as questões relativas à diversidade? As empresas incorporaram as políticas inclusivas em sua organização?
Murilo Lara – Antes de responder a essas perguntas, é importante explicar que o Sindicato das Empresas de Transporte Metropolitano da Grande Vitória (GVBus) representa os consórcios integrantes do transporte metropolitano: os consórcios Atlântico Sul e Sudoeste, responsáveis pela operação do Sistema Transcol, e o Consórcio Cidadania, responsável pelo planejamento e operação do serviço especial Mão na Roda. Ainda entre as suas atribuições, estão a gestão do sistema de bilhetagem eletrônica e as ações institucionais de relacionamento, entre as empresas e os clientes, entre as empresas e o sindicato dos trabalhadores, e entre as operadoras e o órgão gestor, que é a Companhia Estadual de Transportes Coletivos de Passageiros do Estado do Espírito Santo (Ceturb-ES), ligada à secretaria de Mobilidade e Infraestrutura (Semobi).
Dito isso, destaco que as políticas internas relacionadas aos funcionários e clientes, voltadas para a diversidade e a inclusão, são regidas pelas diretrizes particulares de cada empresa associada. Porém, o sindicato não está alheio a essas questões, tanto que promove, em parceria com o governo do estado, ações educativas de conscientização e cidadania no transporte público. E orienta os consórcios que promovam projetos e ações inclusivas dentro das empresas e nas comunidades onde elas estão sediadas.
Além disso, o GVBus atua intermediando a execução de políticas públicas de transporte, inclusive as que envolvem o atendimento de pessoas com deficiências e outras gratuidades, que como estudantes e idosos também. E um dos exemplos disso é o Serviço Especial Mão na Roda.
Technibus – No que consiste o Serviço Especial Mão na Roda?
Murilo Lara – O serviço especial Mão na Roda atende exclusivamente, e de forma gratuita, pessoas com deficiências motoras, temporárias ou permanentes, que utilizam cadeira de rodas. Ele busca e leva mais de 3,6 mil usuários cadastrados para o trabalho, a escola, ao atendimento de saúde, compras e lazer, conforme agendamento prévio, e que existe em pouquíssimas cidades brasileiras.
O serviço foi implantado no ano 2000, e foi criado pelo governo do Espírito Santo com o objetivo de oferecer mais uma forma de locomoção acessível a essas pessoas. Esse serviço é operado pelo Consórcio Cidadania, ao qual pertencem três das operadoras do sistema metropolitano, e é financiado pelo poder concedente. Digo mais um porque o Sistema Transcol possui hoje 100% da sua frota acessível, conforme a legislação exige.
Assim, o Mão na Roda possui 25 ônibus exclusivos para o atendimento a esse público. Inclusive, em agosto de 2020, a frota foi renovada, ganhando 24 novos micro-ônibus adaptados. Os motoristas também atendem exclusivamente esses usuários e recebem treinamento específico para transporte de passageiros com deficiência.
São feitas viagens fixas e eventuais, conforme critérios de prioridades: tratamento de saúde; educação especial e comum; trabalho; lazer e esporte, e outros motivos como supermercado, banco, igreja e outros.
Para solicitar viagens, é preciso fazer um pré-cadastro. E a habilitação é liberada após o cliente passar por uma perícia. O sistema de agendamento é online desde o ano passado, quando implantamos o portal do serviço. Inclusive, agora, no mês de setembro, completamos um ano dessa mudança, com a marca de 26 mil agendamentos realizados somente pelo portal. Se juntarmos os agendamentos feitos via telefone, só em 2021, foram realizadas 44.786 viagens. Um número que consideramos muito bom diante dos objetivos do serviço, que pretende ser totalmente digital e ondemand.
Technibus – Quais as vantagens para os operadores em implementarem os conceitos de inclusão e diversidade no transporte?
Murilo Lara – Duas das principais características do transporte coletivo são a inclusão e a acessibilidade. A mobilidade urbana é um direito fundamental garantido pela Constituição Federal. Por isso, o transporte público é, por sua essência, formado pela diversidade. Qualquer pessoa tem o direito de andar em um ônibus público.
Além disso, sem os ônibus urbanos, a maioria das pessoas não teria como se deslocar para buscar um atendimento de saúde, para ir ao trabalho ou à escola, nem ter uma alternativa com valores mais acessíveis para buscar outros serviços essenciais e o lazer.
Quando uma empresa participa de um processo licitatório e ganha o direito de operar um sistema de transporte coletivo, um serviço essencial, ela traz junto com esse direito a responsabilidade de atender a todos, sem exceção.
Então, quando as operadoras compram ônibus acessíveis, mais econômicos e sustentáveis, quando promovem ações socioeducativas, e trabalham junto do órgão gestor para ofertar assentos preferenciais, gratuidades para pessoas com deficiência, estudantes, e idosos, elas estão cumprindo com o seu papel. E com isso, elas só têm a ganhar, seja de forma econômica, mas também social, conquistando credibilidade junto aos seus clientes e à sociedade como um todo. Mas, em primeiro lugar, quem ganha é a população.
Mas, vale destacar, que, para que tudo isso aconteça, além da iniciativa privada, é preciso que haja um trabalho em conjunto com os governos. Pois é essencial que aos gestores do transporte garantam a remuneração do sistema e o equilíbrio dos contratos para manter um serviço de qualidade e acessível.
Technibus – O senhor acredita que o segmento de transporte coletivo tem procurado adotar políticas inclusivas?
Murilo Lara – Sim. Até porque, sem o passageiro não existe o transporte. E sem o transporte público, os demais setores ficam comprometidos. Vivemos isso muito de perto nos dias mais duros da pandemia. A sociedade precisa do transporte coletivo para se locomover, mas a economia também depende desse sistema. É um ciclo. E a maioria das operadoras já percebeu isso. Além do mais, a nossa sociedade está mais crítica, mais observadora. E já não aceita mais os serviços ruins. Tanto que tem migrado para outros modelos. Recuperar o nosso cliente é um dos maiores desafios que temos pela frente. E só conseguiremos isso quando atendermos a todos de forma igual e justa.
Technibus – Qual a sua expectativa em relação ao Fórum II Transporte Sustentável? O senhor acredita que a divulgação de experiências como o Mão na Roda pode inspirar outras empresas a implementar práticas inclusivas?
Murilo Lara – Acredito que sim. O Mão na Roda é um ótimo exemplo de que ações que envolvam o público e o privado dão certo. E o principal, esse tipo de projeto é fundamental para atender a população de baixa renda. Em especial as pessoas com deficiências ou doenças limitantes. É o Estado, por meio de uma empresa privada, fazendo cumprir a lei, que garante o direito de ir e vir das pessoas. Espero que esse projeto possa inspirar as prefeituras, os governos e as empresas a se unirem e replicarem as iniciativas compartilhadas durante o fórum em suas cidades e estados.
Mais informações: II Fórum Transporte Sustentável