Ricardo Bastos, presidente da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE): “Acredito que São Paulo tem ‘puxado’ o processo de descarbonização do transporte público, e muitas cidades estão seguindo a mesma linha. A tendência é que isso seja ampliado para todo o país”

O diretor de relações institucionais e governamentais da GWM Brasil assume a presidência da ABVE., substituindo Adalberto Maluf, que renunciou para assumir o cargo de secretário nacional de meio ambiente urbano

Technibus – Quais são seus planos para ABVE nos próximos meses?

Ricardo Bastos – A ABVE tem o entendimento de que é preciso uma agenda mais ampla que o veículo elétrico, pois é necessário falar sobre a infraestrutura do país e sobre a redução das emissões de forma abrangente. A entidade tem crescido e acompanhado a evolução da mobilidade. Existem muitas tecnologias que contribuem para a descarbonização, como eletrificação, veículos movidos a gás, híbridos e outras fontes de energia limpa como o etanol. É importante que haja opções para que os países ou regiões possam escolher a mais adequada. Costumo dizer que a melhor tecnologia é a que é viável naquele momento, para determinado país ou região. A ABVE tem essa visão de contribuir para a descarbonização, e vamos continuar nesse caminho.

Technibus – Como o senhor vê a eletrificação no transporte público? E como fazer para acelerar este processo?

Ricardo Bastos – A ABVE tem vários trabalhos, estudos e pesquisas sobre a eletrificação no transporte público. Em São Paulo, por exemplo, a associação atuou, juntamente com outras entidades, contribuindo com a elaboração da lei 16.802 de 2018 (a lei dispõe sobre o uso de fontes motrizes de energia menos poluente e menos geradoras de gases do efeito estufa na frota do transporte coletivo urbano do município de São Paulo). Essa lei não fala sobre uma tecnologia única, mas estabelece metas e prazos para a redução de emissões, deixando que as empresas operadoras busquem as soluções e possam escolher. Acredito que São Paulo tem “puxado” o processo de descarbonização do transporte público, e muitas cidades estão seguindo a mesma linha. A tendência é que isso seja ampliado em todo o país.

Sem dúvida, os ônibus elétricos têm outras vantagens, além da redução das emissões, como o fato de serem silenciosos. A diminuição da poluição sonora contribui efetivamente com a melhoria da qualidade de vida da população, principalmente nos grandes centros. O mesmo vale para os caminhões que atuam nas obras públicas ou na construção civil. Os veículos elétricos nesses casos, além do ganho ambiental claro, também ajudam na qualidade de vida.

Technibus – No setor automotivo como um todo, quais as perspectivas do processo de descarbonização?

Ricardo Bastos – Cada vez mais, temos veículos eletrificados (híbridos e totalmente elétricos) circulando pelas cidades. É uma tendência irreversível. Mas é necessária uma política pública nacional de descarbonização, que ainda não temos. Quando tivermos, vai haver uma aceleração no uso dos elétricos e de outras tecnologias não poluentes. O Brasil tem uma matriz energética limpa, em comparação a outros países. Comparando com a China, por exemplo, o Brasil está muito à frente nessa parte, com uso de energia eólica, solar e hidrelétrica, o que é uma grande vantagem. Hoje as usinas de etanol e açúcar são verdadeiras empresas de energia, transformando os resíduos da fabricação destes produtos em energia. Ou seja, o país tem muitas vantagens e condições de avançar no uso de energias menos poluentes.

Technibus – No Brasil, o cenário atual é favorável para ampliar o uso de veículos elétricos?

Ricardo Bastos – Sim. Acredito que teremos uma política nacional de descarbonização em breve, com uma proposta ainda neste ano. O novo governo federal já deu sinais claros de seu compromisso ambiental. Não apenas de lideranças ligadas ao setor, como a ministra Marina Silva, mas o presidente Lula e o vice-presidente Alckmin também já mostraram sua preocupação com a questão, o que é muito positivo. Obviamente a proposta do governo deverá ser debatida no Congresso, e talvez essa política nacional não seja terminada ainda em 2023, mas devemos ter avanços ainda neste ano. Vamos contribuir com análises, estudos e exemplos para que essa discussão com a sociedade seja produtiva.

Technibus – A infraestrutura para o abastecimento de uma frota elétrica tem sido apontada como o principal entrave para a ampliação do uso dos elétricos. Como o senhor avalia essa questão?

Ricardo Bastos – É importante destacar que não há nada difícil nessa área. Estamos dispostos a trabalhar e construir parcerias e soluções – não apenas no papel – para implementar essa infraestrutura. Já temos iniciativas de criação de pontos de recarga ou de recarga rápida em diversas cidades. E isso está acontecendo em uma velocidade boa, que pode melhorar obviamente. Com certeza, uma política pública nesse sentido vai acelerar bastante o processo. Um bom exemplo é Brasília, que oferece redução de IPVA para os carros elétricos. As empresas de infraestrutura estão atentas a essas iniciativas, que aproveitam essas oportunidades. No Brasil, logo teremos o maior mercado de elétricos da América Latina, à frente de países como Chile e Colômbia. No transporte público, esses países têm um modelo por assinatura dos ativos (veículos e estrutura de abastecimento) muito interessante e que já chegou no Brasil. É uma saída boa para reduzir o impacto inicial da aquisição dos ônibus elétricos. E poderá ser usado para o automóvel também, para o usuário particular ou em frotas comerciais, com contratos de aluguel de modelos elétricos por períodos mais longos. Muitas empresas já buscam esse tipo de contrato.   

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