João Antonio Setti Braga, presidente do conselho diretor da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU): “O brasileiro anseia por um transporte eficiente e transparente, com tarifas módicas e mais qualidade”

“A eletrificação não só é o caminho, como também é um movimento irreversível. Estamos em uma nova era da mobilidade elétrica”, avalia Setti Braga

Technibus – Quais as principais metas nesta nova gestão da NTU que se inicia?

João Antonio Setti Braga – Nossa missão é melhorar o desempenho do setor de transportes urbanos de passageiros, que até hoje enfrenta os efeitos da pandemia da Covid-19. Sendo assim, daremos continuidade ao trabalho de fortalecimento do serviço, que é essencial e estratégico ao Brasil, promovendo maior articulação com os poderes legislativo e executivo. Esse dinamismo é de extrema importância para a nossa gestão, já que temas de interesse estão em discussão, como a reforma tributária e o marco legal do setor. Nesse sentido, entre as nossas metas, está defender um tratamento diferenciado ao segmento na reforma tributária, pois há o risco de aumento dos custos de operação. O reflexo disso seria aumento da tarifa para o passageiro, o que levaria à exclusão de parte da população do transporte público.

Technibus – Qual a sua expectativa em relação à aprovação do novo marco regulatório do transporte público?

João Antonio Setti Braga – O marco legal promoverá mudanças estruturais no transporte coletivo urbano e, certamente, fortalecerá políticas públicas voltadas ao setor. Nossa expectativa é de que, com esse amadurecimento, possamos oferecer ao passageiro um transporte de qualidade nos padrões internacionais. Hoje, existem duas propostas em discussão: o PL nº 3278/21, elaborado pelo ex-senador Antônio Anastasia, que atualiza a política nacional de mobilidade urbana e discute questões como financiamento, regulação e contratos, dentre outros pontos; e a proposta de autoria do Executivo, discutida no âmbito do Fórum Consultivo de Mobilidade Urbana, do qual fazem parte as principais entidades representativas do transporte público no país, incluindo a NTU. Acredito que ambas as propostas têm pontos positivos, mas, claro, podem ser aprimoradas e adequadas à realidade. O brasileiro anseia por um transporte eficiente e transparente, com tarifas módicas e mais qualidade.

Technibus – Quais as perspectivas em relação ao transporte público nos próximos 3 anos? A crise causada pela pandemia já ficou definitivamente para trás?

João Antonio Setti Braga – É inegável que a pandemia da Covid-19 impactou negativamente o transporte público. Calculamos uma perda de R$ 36 bilhões, acumulada desde antes da pandemia e agravada por ela. Agora, nosso árduo desafio é recuperar a demanda perdida no período e melhorar a saúde financeira geral do setor. Para isso, precisamos, urgentemente, que o governo federal consolide a ajuda financeira a estados e municípios, para que possam subsidiar as tarifas, muitas delas defasadas. É certo que o segmento também precisa melhorar seu desempenho, principalmente no que se refere à responsabilidade socioambiental e à modernização da infraestrutura e da tecnologia dos transportes.

Technibus – Como o senhor vê o processo de descarbonização do transporte público no Brasil? A eletrificação é o melhor caminho?

João Antonio Setti Braga – A eletrificação não só é o caminho, como também é um movimento irreversível. Estamos em uma nova era da mobilidade elétrica e já temos grandes cidades, como São Paulo, Salvador, Vitória e Goiânia, discutindo medidas nesse sentido e também destinando parte da frota para ônibus elétricos. Por outro lado, os desafios de implantar esse modelo são enormes. Destaco alguns pontos: a viabilidade de financiamento para a compra dos veículos, a infraestrutura das vias urbanas, bem como de terminais e garagens, principalmente para o recarregamento dos ônibus. Ainda temos o custo desse transporte. Defendo a necessidade de migrarmos para um transporte coletivo limpo nas cidades brasileiras, mas isso não será possível sem um planejamento robusto e políticas públicas bem estruturas. Além de tudo que já mencionei, esbarramos com a falta de legislação que normatize a descarbonização em âmbito nacional. Se não houver uma norma nesse sentido, cada cidade vai definir seus próprios parâmetros e isso resultará em uma grande desorganização, além da oneração da indústria, que não terá uma única referência durante essa transição.

Technibus – Que medidas a NTU espera que sejam tomadas pelo poder público para garantir uma mobilidade mais sustentável no país?

João Antonio Setti Braga – O transporte urbano é um dos 17 setores mais pujantes da economia brasileira. Nós fazemos parte dos segmentos que mais empregam no país e estamos diretamente ligados ao dia a dia das pessoas. Esperamos naturalmente uma atenção do poder público para que o setor continue prestando o serviço de maneira inclusiva e sustentável. Nesse sentido, as empresas de ônibus coletivo têm a expectativa de que o governo federal assuma o protagonismo desse serviço essencial, já que as prefeituras não vão conseguir arcar com todos os custos sozinhas. Dentre as medidas necessárias estão incentivos em linhas de crédito para a renovação da frota de ônibus. Atualmente, para que tenhamos uma média de idade ideal dos veículos, seria necessária a substituição de cerca de 30 mil ônibus em todo o país.

O setor espera ainda, como já mencionado, um tratamento tributário diferenciado. De acordo com estudo da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), o impacto da reforma tributária sobre o transporte público urbano pode chegar a 20%, dependendo do modelo adotado. Certamente, os custos irão recair sobre o passageiro pagante, que muitas vezes é de baixa renda. Por isso, precisamos de uma reforma que não aumente a carga tributária de quem usa o transporte público. Outras questões essenciais, que precisam ser priorizadas pelo governo, são a manutenção da desoneração da folha de pagamentos; a ampliação da política de subsídios aos passageiros, por parte do poder público; e políticas de melhoria da infraestrutura bem estruturadas, pensadas a curto, médio e longo prazos. No fim, tudo está relacionado com a ampla discussão e adoção de um novo marco regulatório para o setor, que é a questão central para nós nesse momento.   

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