Secretário defende ousadia para o Brasil se tornar potência ferroviária

Leonardo Cezar Ribeiro, secretário nacional de transporte ferroviário, afirma que o Brasil tem que “pensar grande” para se tornar uma potência no setor de ferrovias

Alexandre Asquini

“A gente não pode ter a alma tímida. Tem que pensar grande, pensar que o Brasil pode ser uma potência no setor de ferrovias.” Com essa afirmação, o secretário nacional de transporte ferroviário, Leonardo Cezar Ribeiro, abriu no dia 25 de junho a segunda edição do webinar “Os Avanços da Indústria Ferroviária”, promovido pela Abifer, sintetizou a visão estratégica do governo federal para o setor. Ele também enfatizou que a secretaria “não tem medo de errar, mas tem medo de ser omissa” diante dos desafios do transporte ferroviário no país.

Leonardo Cézar Ribeiro

Mobilização setorial

Realizado no canal oficial da Abifer no YouTube, o webinar integra a programação do movimento “Mais Trilhos, Brasil!”, que visa dar visibilidade às demandas e soluções da indústria ferroviária. Coordenado pela jornalista Ana Lúcia Lopes, o encontro contou com a participação do presidente da entidade, Vicente Abate, e de representantes de empresas associadas, que apresentaram produtos e inovações de oito segmentos da indústria ferroviária brasileira: vagões, locomotivas, carros de passageiros, via permanente, máquinas de manutenção, equipamentos elétricos e mecânicos, além de sistemas e tecnologias de sinalização.

Tripé do avanço

Em sua exposição, o secretário ressaltou que o setor ferroviário é estratégico para o governo, consideração evidenciada pela criação, em 2023, da própria Secretaria Nacional de Transporte Ferroviário. Ao assumir a pasta, explicou, foi feito um diagnóstico que apontou gargalos relevantes, levando à adoção de três frentes prioritárias: uma estratégia de funding, um banco de projetos estruturados e um portfólio normativo capaz de destravar os investimentos privados. “Esse é o tripé sobre o qual estamos organizando o desenvolvimento ferroviário”, afirmou.

Mais participação na matriz

Nesse contexto, destacou a elaboração em curso do Plano Nacional de Ferrovias, cuja meta é elevar a participação do modal na matriz de transportes do país dos atuais 20% para até 40%. “Para isso, precisamos trabalhar em todo o território nacional”, disse, citando eixos de desenvolvimento norte-sul e leste-oeste que estão sendo estruturados.

Entre os avanços, mencionou a conclusão da Norte-Sul em 2023, ligando Estrela d’Oeste (SP) a Açailândia (MA), com 2.200 km, e o lançamento da audiência pública para o leilão do Corredor FICO/FIOL — que compreende a Ferrovia de Integração Centro-Oeste (FICO), prevista para ligar Mara Rosa (GO) a Vilhena (RO), e a Ferrovia de Integração Oeste-Leste (FIOL), que conecta o oeste da Bahia, em Caetité, ao porto de Ilhéus, no litoral baiano.

Base industrial forte

O secretário chamou atenção também para a relevância das autorizações ferroviárias previstas na Lei 14.273, que permitem maior flexibilidade ao setor privado. Ele defendeu o fortalecimento da indústria ferroviária nacional como pré-requisito para uma ferrovia forte: “É assim no mundo todo. Se queremos mais ferrovias, precisamos de uma indústria preparada para produzir vagões e locomotivas aqui no país”.

Previsibilidade e contratos

Criticando a retração produtiva nas últimas décadas, afirmou que, embora haja tendência de crescimento com a retomada dos investimentos a partir de 2022, ainda se produz menos do que nos anos 2000 e 2010. Nesse ponto, remarcou a necessidade de previsibilidade para a indústria, especialmente em relação às encomendas.

“Os contratos renovados da Vale, MRS e Rumo tinham investimentos previstos na modelagem econômico-financeira que não estavam explícitos nos contratos. Corrigimos isso com a Portaria 538/2024, incluindo dispositivos que garantem previsibilidade de contratação para a indústria”, explicou.

Leasing e shortlines

Ele também revelou que o governo está fechando uma política pública específica para material rodante, com dispositivos que assegurem o alinhamento entre investimentos e contratos, e antecipou a proposta de estimular o mercado de leasing ferroviário, inspirado em modelos internacionais como o da aviação. “Por que não podemos desenvolver um mercado de leasing para ferrovias, como ocorre com os jatos? Isso valoriza o ativo, desobriga o operador de aquisição direta e fortalece a indústria”, argumentou.

Ao mencionar o papel das shortlines — ferrovias de menor extensão e operação diferenciada —, reforçou que elas podem ser um novo vetor de industrialização ferroviária, inclusive com possibilidades de uma indústria 4.0 adaptada a essas operações.

Segurança fiscal e qualificação

Para viabilizar os investimentos de longo prazo, defendeu o uso de contas vinculadas que garantam a alocação contínua de recursos ao setor, mesmo em contextos fiscais restritivos. “Esses investimentos são plurianuais e exigem segurança e previsibilidade”, afirmou, lembrando sua experiência anterior na Secretaria de Orçamento Federal e no Marco Legal das Ferrovias.

Segundo ele, o desenvolvimento do setor exigirá ação conjunta de diferentes áreas do governo, incluindo os ministérios do Transporte, do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) e do Trabalho. Destacou, ainda, o papel da qualificação profissional e o uso dos Recursos para o Desenvolvimento Tecnológico (RDT) oriundos dos contratos ferroviários, como componentes essenciais da política industrial.

Diálogo e futuro

O secretário concluiu reafirmando o compromisso da pasta com o diálogo: “Estamos abertos a ouvir a indústria, e ouvimos muito a ABIFER e seu presidente. Ouvindo mais, a gente erra menos”. Entre os objetivos mais ambiciosos da atual gestão, ele destacou a realização do primeiro leilão de ferrovia greenfield do Brasil, em parceria com o setor privado: “Isso significa construir ferrovias que hoje ainda não existem. E é esse o futuro que queremos.”

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