Ao contrário da transição que o mundo enfrentou há 100 anos, ao mudar de uma tecnologia para outra tecnologia – dos cavalos para o veículo a combustão –, hoje são várias fontes de energia sendo vislumbradas para o transporte rodoviário – elétricos, biometano, hidrogênio renovável e o diesel verde (HVO). Qual dessas tecnologias é a melhor? Esse questionamento fez parte do debate sobre Inovação Tecnológica Veicular e Transição Realista, durante o Seminário Nacional NTU.
Na avaliação de Walter Barbosa, vice-presidente de vendas, marketing, peças e serviços de ônibus da Mercedes-Benz do Brasil, todas as tecnologias têm a sua utilidade, mas não serão adequadas para todas as cidades. “O Brasil tem 5.500 municípios e cada um tem a sua particularidade, demanda e disponibilidade de recursos. Um necessita investir mais em educação, o outro em saúde, em transporte e em segurança e a única certeza que temos é que não haverá uma única tecnologia capaz de fazer a transição de toda matriz energética em nosso país. Haverá uma combinação de tecnologias.”
Barbosa destacou que a mudança de matriz energética não depende da tecnologia e sim de planejamento, que precisa estar alinhado a outras condições nesta fase de transição. “É preciso analisar a tecnologia, a política pública, quem vai pagar os investimentos, como serão pagos, quanto o usuário vai pagar e quanto o município vai subsidiar.”
Além do financiamento, é preciso olhar para a infraestrutura, segundo o executivo da Mercedes-Benz. “Seja biogás, biocombustíveis, elétrico, isso demanda tempo e a infraestrutura não se faz em curto prazo, depende de planejamento da cidade em relação às construções, instalação de torres, cabos e dutos.”
Barbosa afirmou que não é possível elaborar um planejamento para mudar a matriz energética em quatro anos. “Isso não vai funcionar. Tem que planejar olhando para o longo prazo, de 30, 40 e 50 anos. É assim que faz um planejamento para mudança de matriz energética.”
O vice-presidente de vendas de ônibus da Mercedes-Benz citou as tecnologias que estão disponíveis no país. A Euro 6, que reduz em 80% a emissão de Nox e em 50% de material particulado, e os biocombustíveis, que estão evoluindo em grande velocidade, têm hoje 14% de adição de biocombustível ao diesel, com meta de atingir 20% até 2030, podendo reduzir significativamente as emissões de CO2.
Outra opção é o HVO (diesel verde) de alta tecnologia com o combustível hidrogenado que pode reduzir em até 80% o CO2 e ser utilizado em até 100% no veículo. Tem ainda o BeVant, cujo processo é feito por meio de bidestilação e reduz de 60% a 70% o índice de emissão de CO2, com a metade do preço do HVO. “Essa também será uma solução para o nosso país bastante realista”, disse Barbosa. Tem ainda os elétricos, o biometano, o ônibus a hidrogênio e a combinação de hidrogênio com bateria (fuel cell).
Barbosa sugere que a migração para tecnologias mais limpas no transporte coletivo seja feita por etapa, substituindo a frota Euro 3 por Euro 5, a Euro 5 por Euro 6 e a Euro 6 por biocombustíveis, migrando para os modelos movidos a biometano e os elétricos. “A cidade de São Paulo precisa renovar 1.500 ônibus todos os anos e não consegue por conta da limitação de energia. Temos muitas tecnologias e todas terão uma contribuição significativa para reduzir as emissões, mas é preciso um bom planejamento para fazer essa transição e explorar mais o que está disponível e compatível com o orçamento dos municípios.”
Combustíveis limpos
Jorge Carrer, diretor de vendas ônibus da Volkswagem Caminhões e Ônibus do Brasil, citou a cidade de Goiânia, que passou anos sem conseguir renovar a sua frota, e hoje está em evidência como um dos melhores sistemas de transporte do Brasil, ao passar a desenvolver um planejamento de longo prazo para dar prioridade e qualidade ao transporte público, de forma que ele seja a primeira escolha para quem tem que viajar e que gere receita.
“O Brasil tem uma frota enorme de veículos Euro 3 e faz sentido trabalhar fortemente a renovação dessa frota pelos modelos Euro 6, os quais são menos poluentes, do que dar um salto tecnológico com veículos que exigem recursos elevados. O papel da indústria é ajudar nessa transição, mas também fazer esse alerta de ter que buscar todas as alternativas e não focar na mais fácil”, disse Carrer.
Paulo Arabian, diretor comercial de ônibus da Volvo Buses Latin America, afirmou que não há uma bala de prata e nunca terá. “O biogás é muito interessante em vários aspectos, mas também tem entraves de implementação de infraestrutura, que não é tão simples. A infraestrutura demanda armazenagem, compressores pesados para fazer o abastecimento com vazão mínima condizente com os intervalos de parada dos ônibus.
O HVO também é excelente como alternativa, o biodiesel é 100%. “Hoje a tecnologia é comum no parque industrial automotivo e todos os fornecedores diretos e indiretos dessa indústria têm o mesmo acesso tecnológico”, disse Arabian.
Marcelo Galão, diretor de desenvolvimento de novos negócios da Scania Operações Comerciais do Brasil, destacou que está ficando caro a combustão utilizando o diesel. “Do Euro 5 para o Euro 6 reduzimos em 80% a emissão de NOx e 50% de material particulado, mas essa redução não foi um milagre tecnológico. É o pós-tratamento, foi adicionado o filtro de partícula DPF, reforçado o sistema de injeção do Arla 32, e isso é custo. Não é somente custo adicional de aquisição, mas custo de manutenção ao longo da vida útil”, explicou.
Na avaliação do diretor da Scania, com a mudança de motorização de Euro 6 para Euro 7, esses sistemas vão ficar mais robustos e encarecer o produto. “O motor elétrico é mais simples que o diesel. Não tem necessidade de filtro de partícula, de sistema de injeção de Arla. “O ônibus elétrico não tem ruído, é confortável e mais simples.”
Bruno Batista, consultor especialista em transportes, ex-diretor da Confederação Nacional dos Transportes (CNT), citou que os desafios da transição energética estão na construção de novas infraestruturas, pois migrar do petróleo para outras tecnologias não é fácil, rápido e barato. E nas garantias de suprimento energético, pois não adianta oferecer determinada energia que vai faltar daqui a cinco anos e os ônibus vão ficar parados nas cidades.
O consultor destacou também a necessidade de investimentos, o qual é um fator crítico, pois não é barato virar essa chave. Falou sobre a formação de mão de obra e a falta de motorista e mecânico. “Imagina mudar uma frota para elétrico, biometano ou hidrogênio. É preciso formar um novo contingente de mão de obra para atender a nova frota de veículos.”
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