Na última semana, o Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria para acolher os embargos de declaração apresentados pela CNT (Confederação Nacional do Transporte) e pela CNTTT (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Terrestres) na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5322), que trata da Lei do Motorista (Lei nº 13.103/2015). As confederações argumentaram em favor da modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade de artigos da lei.
Com 11 votos favoráveis, o STF decidiu aplicar o efeito ex nunc, ou seja, sem retroatividade. Segundo a CNT, caso o acórdão embargado entrasse em vigor sem a devida modulação, geraria um passivo trabalhista superior a R$ 250 bilhões, resultante das ações que provavelmente seriam movidas com base na alegada inconstitucionalidade. Além disso, está garantida a autonomia das negociações coletivas.
No Evento Fretamento 2024, Lisa Arcaro, da Codgnotti e Arcaro Advogados, abordou as mudanças decorrentes do embargos de declaração e apontou alguns caminhos para os empresários se adaptarem à legislação. “Tivemos alguns avanços com os embargos, principalmente em decisões ocorridas mediante acordos coletivos, como jornada flexível, manutenção dos exames toxicológicos, limite de tempo de direção sem intervalos, escala 12×36, redução de horário de almoço, prorrogação da jornada por quatro horas e a possibilidade de sanções disciplinares”, resume a especialista.
Em julho do ano passado, o STF havia declarado que uma série de itens da Lei do Motorista eram inconstitucionais, o que trouxe impactos negativos para os transportadores de passageiros e de carga. Agora, com o acolhimento dos embargos, o que mais prejudica as empresas que trabalham com turismo é a questão do segundo motorista nas viagens mais longas. No fretamento para turismo, em linhas mais extensas, normalmente as empresas colocam dois condutores para haver um revezamento e para que seja cumprido limite de horas de trabalho. Pelo entendimento do STF, se o motorista estiver embarcado e o veículo estiver em movimento, ele está trabalhando, ou seja, está em jornada de trabalho.
Soluções-
Lisa Arcaro acredita que as empresas do setor devem buscar alternativas para se adaptar à regra. “Não vemos, neste momento, possibilidade de que isso seja revertido. O que fazer então? Contratar um motorista em uma cidade ao longo do percurso? Muitas vezes isso é inviável. Uma alternativa é firmar parcerias entre as empresas para compartilhamento de garagens. A ideia de um condomínio de empregadores (união de vários empregadores para contratação de funcionários) também pode ser interessante”, comentou.
Os operadores de fretamento que atuam no mercado de turismo estão buscando soluções para esse impasse. Raul Marcondes, da J. Marcondes, acredita que o setor precisa continuar a questionar essa regra. “Não temos como deixar um motorista no meio do caminho e contratar outro. Isso não tem lógica. É possível pensar em outras formas que não prejudiquem as empresas nem os motoristas. Acredito que quem tomou essa decisão não conhece profundamente como funciona o setor”, desabafou.
Alex Pereira, da Advance Transatur, destacou que os ônibus utilizados em rotas mais longas oferecem todo o conforto para que o segundo condutor possa descansar adequadamente. “Considerar o tempo de descanso do motorista dentro do ônibus como horas trabalhadas vai gerar um grande número de horas-extras. Nossos ônibus contam com camas e todo o conforto para os trabalhadores”, afirmou.
Francisco Mazon, da Santa Cruz, contou que consegue fazer a troca de motorista em outras garagens da própria empresa, que ficam ao longo dos percursos mais distantes. “No nosso caso, são poucas as rotas longas, apenas umas quatro linhas têm esse problema. Felizmente conseguimos resolver dessa forma, com um bom planejamento”, disse.