Entrevista: Khalid Alhogail, presidente da UITP

Os transportes permitem a vida.
Fazem o mundo funcionar.
Por Fred Carvalho, de Barcelona

A experiência ajudou a conseguir esta entrevista exclusiva com Khalid Alhogail, presidente da União Internacional de Transporte Público (UITP) em seus últimos dias de mandato durante o congresso da entidade, em Barcelona. Foi preciso muita resiliência, um pouco de atrevimento e também a sorte que todo jornalista deve ter.

Na conversa obtida, Khalid mostra toda a importância dos transportes, da sua presença forte durante a pandemia a permitir a movimentação dos laboratórios, hospitais, fábricas, produtores e processadores de alimentos, remédios, vacinas, profissionais de todos os níveis nas principais profissões fundamentais para o mundo continuar a funcionar mesmo quando o medo era dominante em todas as regiões do planeta.

O executivo se mostrou feliz com a escolha da canadense Renée Amilcar com sua sucessora e tem muita confiança no trabalho da primeira mulher a assumir a presidência da centenária entidade. 

Technibus – Como foi comandar a UITP durante a pandemia?

Khalid Alhogail – Há 15 anos sou membro muito ativo da entidade e sempre estive ligado aos grupos de comunicação com a imprensa, conselho executivo, conselho de políticas e, claro, da assembleia geral. Isto tornou minha vida, mesmo com as dificuldades da pandemia, mais produtiva neste período. E dada esta conexão que me permite reunir conhecimento e experiência, tenho muito orgulho de, junto aos meus colegas de diretoria executiva e da secretaria, termos passado pelos problemas que todos tiveram desde a pandemia mantendo a nossa estabilidade emocional e também apoiando as finanças da entidade enquanto prestávamos serviços aos nossos membros com o uso da tecnologia nos conectando por todos os meios para que nossos produtos e ações pudessem continuar.

Eu fazia pesquisas, estudos e treinamento on-line e agora aqui estamos nos, passada a pandemia, construindo e realizando este grande Congresso que bateu todos os recordes que tínhamos até então.

Technibus – E quais são os desafios para o próximo presidente? Quais as maiores dificuldades?

Khalid Alhogail – Em primeiro lugar acredito que qualquer presidente é uma continuação do anterior. O novo sempre é uma continuação do futuro da organização. Porque nós, como pessoas, representamos o trabalho em equipe mais do que um indivíduo, e nossa missão é implementar os objetivos da diretoria que lidera a organização. Com este entendimento, haverá sempre desafios, mas também haverá a ambição de ultrapassar e partir para o futuro. Sempre muito firme, muito forte e a esperar o melhor da organização.

Technibus – Depois dos primeiros momentos da pandemia você sentiu orgulho de o setor de transportes ser independente e corajoso e não ter parado? Afinal, se os aviões ficaram estacionados nos aeroportos, em sua maioria, os ônibus, caminhões, trens, metros, não pararam.

Khalid Alhogail – Estou muito feliz por você ter mencionado isso, o que significa que você foi muito justo em reconhecer que, durante a pandemia, não vimos aviões, não vimos remessas. Mas vimos as pessoas na linha de frente do nosso negócio movendo as pessoas da saúde para apoiar os pacientes, suas casas e hospitais e manter a vida por meio do transporte da conectividade entre todos os serviços enquanto os outros estavam em isolamento em suas casas.

Isto reflete a importância de nosso setor como essencial, como vital. As pessoas ainda podiam fazer o trabalho, mas precisavam chegar aos seus destinos e voltar para casa por nosso intermédio. Fomos nós que conectamos as pessoas aos seus destinos, seja casa, trabalho ou lazer.

Technibus – Há quanto tempo está na UITP?

Khalid Alhogail – Fui vice-presidente por cinco anos de antes de me tornar presidente. E já era parte do comitê de decisão, que é a diretoria executiva, como presidente e vice-presidente, o que me aproximou muito da tomada de decisão, dos problemas ocorridos e da solução junto aos meus colegas de como fazer melhor e levar a UITP para o próximo nível, chegando onde merece estar.

Nos movemos pensando juntos para ver como podemos fazer as melhores entregar. Esta é uma situação única que no será encontrada em outras associações. Por exemplo, a IATA representa apenas o operador, distante dos reguladores ou do fabricante.

Technibus – O que você acha das novas energias, dos novos sistemas, dos ônibus elétricos, das células de combustível?

Khalid Alhogail – Esse é o desafio que temos de enfrentar. Existem pessoas pensando na descarbonização. Tem esforços mundiais na redução das emissões, mas também temos pessoas pensando na digitalização, na automação. Todos estes interesses, juntos, mantem a nossa indústria sempre em movimento, somos um setor muito dinâmico. É aqui que precisamos refletir bastante pois precisamos conhecer o nosso caminho. Onde está a melhor trilha para seguirmos e refletirmos? E onde estão as trilhas que refletem alguma instabilidade que devemos evitar? E entre cá e lá, sempre pensamos juntos qual é o melhor caminho.

Claro que o desafio energético é algo que atingiu todo o planeta. Mas convenhamos que somos diferentes neste planeta. As coisas na América Latina são diferentes das coisas na Europa, que é diferente da Asia-Pacifico. Falo, entre outras coisas, das habilidades, das finanças, dos interesses, a capacidade de fazer as coisas.

Portanto, entre isso e aquilo, não podemos nos mover juntos no mesmo ímpeto. Temos de fazer um por um com base em quem está mais bem equipado para fazê-lo e dar um bom exemplo aos outros sobre como isto funciona. 

E este é o nosso papel. Reunir tudo isto e dar os melhores conselhos para alavancar o melhor de nós. Temos uma estratégia chamada “People First”, o que significa que as pessoas – nossos colaboradores, nossos clientes – precisam de nossa conexão. Esta é a função do transporte.

Technibus – Na abertura deste congresso de Barcelona você disse que este evento é muito bom para fazer novos amigos e bons negócios. Entre domingo, o primeiro dia, e hoje eu vi vários grupos com muitos amigos e negócios novos.

Khalid Alhogail – Eu pessoalmente desenvolvo minhas habilidades desenvolvendo minha rede através da UITP para conhecer todos, em todos os lugares. Este networking é fundamental. Assim aprendo lições com a experiência japonesa, por exemplo. E algo dos brasileiros, algo dos europeus. Estou faminto por todo o melhor conhecimento e a melhor experiencia que outras pessoas tem. É aqui que temos a oportunidade de vir através do congresso, para trocar com outras pessoas a nossa experiencia. E parece uma fazenda que você vai colher rosas: aqui estamos colhendo rosas e trocando com as pessoas queridas.

Technibus – O que você acha de a UITP ter uma mulher na presidência pela primeira vez na história?

Khalid Alhogail – Estou muito orgulhoso com o interesse das pessoas na igualdade de gênero. Eu, pessoalmente, dou um grande apoio a minha amiga Renée para ser a primeira mulher presidente desta Associação, que é liderada por homens há 138 anos. Eu poderia ter estendido o mandato para os próximos anos, mas acho que ofereci muito e ainda há muito a ser dado que exige tempo, que ela tem, além da vontade de continuar nessa jornada. Fui o primeiro a apoiá-la de forma proativa e ampla.

Technibus – O próximo Congresso da UITP, em 2025, será em Hamburgo, maravilhosa cidade alemã. E o Brasil quando terá um Congresso da Entidade? 2027?

Khalid Alhogail – Hamburgo também. Mudamos nossa estratégia de eventos. Sabemos que 2/3 dos congressistas são europeus. Levando isto em consideração mudamos nossos congressos que eram a cada dois anos para anuais. Mas fizemos isto de forma inteligente. Os numeros impares sempre estarão na Europa e os numeros pares fora da Europa para alcançarmos mais pessoas de fora da Europa. Assim desejamos que o Brasil apresente seu pedido para ser considerado anfitrião. Recebemos solicitações de todo o mundo e se as comparamos com nossa dimensão, nossos requisitos e nossos filtros para garantir que levaremos as pessoas ao melhor lugar em hospitalidade, transporte, experiência e pronto para recebe-las – como a FIFA faz com a Copa do Mundo. O Brasil é um país com grande experiência.

Adoraríamos ver a edição latina chegando pelo Brasil ou outro país e que nos procurassem para falar sobre 2028. 2025 será em Hamburgo, 2027 também e 2029 poderia ser em Hamburgo ou outra cidade europeia, enquanto 2026 foi anunciado em Dubai, 2028 está em discussão e 2030 aberto para solicitações. Adoraríamos ver vocês alavancando essa ideia no Brasil.

Agora estamos em Barcelona depois de muitas décadas. Fizemos uma em 1926 e outra na década de 70. Seria interessante visitar São Paulo ou o Rio de Janeiro mais uma vez.

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