Por Márcia Pinna Raspanti
Technibus – Como foram os últimos dois anos para a BluMob? A crise causada pela pandemia já ficou para trás?
Maurício Garroti – O ano de 2022 foi marcado por grande retomada frente aos desafios recentes da pandemia e pós-pandemia. A situação foi bastante complexa para nós no período 2019-2021, assim como foi para todo o setor, mas com uma particularidade que tornou a condição ainda mais crítica: o estado de Santa Catarina proibiu o funcionamento do transporte coletivo durante vários períodos da pandemia, que totalizaram paralisação integral de nossas operações por mais de três meses, algo sem precedente e que não foi visto, salvo engano, em nenhum lugar do mundo. Como consequência óbvia, além do forte impacto momentâneo, esta situação resultou em novas e permanentes condições na mobilidade, uma vez que pessoas, empresas e toda uma cidade necessitou de alternativas para seus deslocamentos. Foi momento de focar ainda mais na busca oportunidades internas, na governança, em sermos cada vez mais eficientes. As constantes discussões com o poder concedente e com a agência reguladora também possibilitaram diversos ajustes à nova realidade, sempre focados na manutenção do serviço, na equalização de oferta-demanda, na tentativa de atratividade para os serviços. Neste sentido, a oferta sendo ampliada de forma concomitante com a retomada das atividades. Há forte acompanhamento de cumprimento de obrigações tanto por parte do município quanto pela agência reguladora, inclusive quanto a índices contábeis e financeiros. Obviamente isto exige bastante da BluMob, mas confere aderência também à concessão, que é bastante respaldada na transparência dos dados. Temos atualmente cerca de 74% da demanda que tínhamos em período pré-pandemia, abaixo da média geral e bem aquém de diversas localidades onde cenário já é de retomada total, até acima do que encontravam em 2019.
Technibus – A empresa apresentou novidades no último ano?
Maurício Garroti – Por ser uma Sociedade de Propósito Específico (SPE), conforme estabeleceu a licitação do município de Blumenau, a BluMob pode operar exclusivamente o transporte coletivo objeto do contrato da concessão. Por ser um contrato relativamente recente, nosso perfil de frota é jovem e o pacote de partida da operação, estabelecido pelo município, já contemplou diversas condições na totalidade da frota, adquirida 100% zero km desde primeiros períodos da concessão (tais como monitoramento em tempo real da frota, acessibilidade, internet wi-fi, aplicativo para o usuário para acompanhamento do ônibus em tempo real) que não exigiram implementações ao longo deste último ano. Entretanto, focamos em melhorias constantes, por meio da tecnologia, para melhor experiência do usuário e controles de nossos serviços. Assim foi com o investimento que realizamos em telemetria. Temos atualmente 100% da frota equipada com esta tecnologia, nos permitindo melhor eficiência em consumo de combustível, ambientalmente mais correta, e com acompanhamento e atuação sobre indicadores como freadas, aceleração e curva bruscas, o que se reverte em uma condução mais amistosa e segura para o usuário, menos estressante para nossos funcionários. Em 2022, tivemos 100% da frota aferida e aprovada no Despoluir, o Programa Ambiental do Transporte. Também implementamos melhorias em nosso aplicativo voltado ao usuário, com novidades em formas de pagamento e serviços digitais remotos, que dispensam a presença pessoalmente daqueles que necessitam de alguns de nossos serviços.
Technibus – Como está a situação do mercado atualmente?
Maurício Garroti – A retomada do nível de demanda, especificamente na cidade de Blumenau, foi aquém da que projetávamos para o ano de 2023. Há mudanças consolidadas nas formas de deslocamento por todo o contexto da pandemia e já descritos anteriormente, na dinâmica não só da mobilidade, mas das formas de trabalho, do estudo. Conforme trabalhos técnicos em conformidade com o poder concedente, temos ampliado oferta e principalmente realizando ajustes de horários e linhas de forma constante. Com a frustração da demanda projetada, devemos alcançar uma receita da ordem de 6% maior que 2022, o que representa exclusivamente o aumento tarifário. É uma condição de pressão, uma vez que temos um cenário de custo com variações em patamares maiores do que este em salários e benefícios, diesel, pneus e peças, em especial.
Technibus – E para 2024, quais as expectativas da empresa?
Maurício Garroti – Igualmente desafiador, considerando que as medidas fundamentais para mudanças estruturantes não são as de curto prazo, e temos um ano de eleições municipais. Somado a isto, temos um cenário complexo para os custos, como por exemplo para o combustível, segundo maior custo e que terá impactos, a considerarmos condição atual, com o retorno de PIS e Cofins em janeiro de 2024. Os investimentos em frota também guardam grande desafio, dado o patamar de preços atual frente ao cenário global e novas tecnologias, bem como as taxas de juros.
Technibus – Quais foram os principais investimentos no ano passado?
Maurício Garroti – Em 2023 realizamos a aquisição dos primeiros chassis Euro 6, recebidos no segundo semestre, como forma de ampliação da frota dedicada ao transporte coletivo de Blumenau. Somados a estes novos veículos, também investimos, desde final de 2022, em melhorias nos 21 ônibus de 15 metros que atendem a principal linha troncal da cidade, implementando neles ar condicionado. Assim, ampliamos a frota com ar-condicionado para mais de 20%.
Technibus – E quais são os investimentos previstos para 2024?
Maurício Garroti – Há uma expectativa, ainda em construção, de investimentos em sistema de monitoramento por câmeras em 100% da frota e também em estruturas físicas (garagens). Os montantes, talvez também considerando investimento em renovação de frota, estão em estudos.
Technibus – Quais são hoje as principais dificuldades do setor?
Maurício Garroti – A mobilidade urbana no Brasil enfrenta dificuldades que remetem a escolhas e políticas que evidentemente resultaram na condição complexa e inadequada que temos atualmente nos deslocamentos urbanos, especialmente no transporte coletivo urbano, que perde eficiência e competitividade. De forma sintetizada, diria que é preciso priorizar o transporte coletivo, revisar a forma de custeio e possibilitar assim a melhoria na qualidade dos serviços aos usuários, condições que não são segredo algum e estão consolidadas mundo afora, além é claro de outros ajustes menos estruturantes, mas igualmente necessários para atratividade nos meios coletivos. É fundamental refletir sobre o que a sociedade quer e necessita em termos de mobilidade, rompendo com um ciclo, com problemas em uma espiral sem fim. No transporte coletivo, esta espiral pode ser evidenciada por um cenário constante de aumento de custos, perda de eficiência e prioridade, aumento de tarifa, redução de usuários. É preciso corrigir esta constante e é inaceitável que o foco continue sendo excessivo nos deslocamentos individuais por carros. O custo, seja financeiro ou em qualidade de vida, é pago por toda a sociedade. De toda forma, não é tarefa fácil, mas possível, à medida que, de forma técnica, realista e participativa, revisemos integralmente os objetivos em mobilidade de nossas cidades. Importante relembrar e destacar que o transporte coletivo é, além de um direito constitucional, mais eficiente do ponto de vista do uso do espaço urbano, mais democrático e ambientalmente mais correto.