Mesmo em um cenário marcado por juros elevados, incertezas econômicas e retração do investimento no mercado interno, a indústria brasileira de ônibus caminha para encerrar 2025 com crescimento na produção. Os dados da Associação Nacional de Fabricantes de Ônibus (Fabus) mostram que, até outubro, foram fabricadas 23.259 unidades, alta de 1,9% em relação ao mesmo período de 2024, quando foram produzidas 22.817 unidades.
A expectativa é fechar o ano com 27.900 veículos produzidos, crescimento de 3,1% sobre 2024, quando foram fabricadas 27.000 unidades. Embora inferior à previsão inicial de expansão de 5%, o resultado reflete a sustentação da atividade industrial em um contexto macroeconômico adverso, marcado por juros elevados e restrição ao crédito.
As informações foram apresentadas por Ruben Bisi, presidente da Fabus e diretor do Sindicato Interestadual da Indústria de Materiais e Equipamentos Ferroviários e Rodoviários (Simefre), ao participar, em 26 de novembro de 2025, em transmissão de vídeo, do seminário anual desta entidade.
Exportações garantem
Ruben Bisi disse que o principal fator de limitação em 2025 foi a desaceleração do mercado doméstico. “No mercado interno, realmente a situação dos juros tem pesado bastante e assim deveremos crescer somente 0,3% em 2025 sobre 2024”, afirmou.
O avanço da produção foi assegurado, sobretudo, pelo mercado externo. As exportações de ônibus cresceram 25,9% no acumulado do ano, impulsionadas majoritariamente pela Argentina. “Houve até aqui 25,9% de crescimento. Basicamente, a Argentina tem puxado muito a importação de produtos automotivos: caminhões, autopeças e também ônibus. O mercado argentino está muito aberto à importação”, explicou Bisi.
Segundo ele, o país vizinho responde hoje pela maior parte das encomendas externas. “Na verdade, não temos um mercado muito forte a não ser a Argentina, que está realmente puxando bastante a produção da exportação”, completou.
Sinais positivos para 2026
Apesar das dificuldades enfrentadas em 2025, a avaliação do setor é de que o próximo ano reserva oportunidades significativas. Entre os fatores estruturais destacados está a permanência do crescimento do turismo interno acompanhado do impacto dos preços das passagens aéreas, o que estimulou uma migração de usuários para o transporte rodoviário.
Outro ponto enfatizado é que, apesar dos desafios, as operadoras de transporte mantêm receita e não enfrentam crise de demanda, o que sustenta a capacidade de renovação futura da frota, ainda que com cautela.
O presidente da Fabus também mencionou a possibilidade de ampliação do financiamento para veículos de baixa emissão, com uso de recursos do Fundo Clima. Bancos privados estariam avaliando a entrada mais ativa no setor, ao lado do BNDES, para apoiar a aquisição de ônibus descarbonizados.
Na área de políticas públicas, a entidade acompanha tratativas com o Ministério das Cidades para ampliar os recursos destinados tanto à infraestrutura quanto à compra de ônibus urbanos. Em 2025, foram alocados R$ 4,5 bilhões para cada frente, e a expectativa é que esses valores possam ser ampliados no próximo exercício.
No curto prazo, o setor aguarda a realização do pregão do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para a aquisição de 7.470 ônibus escolares, cuja parte técnica já foi finalizada.
Tarifa zero em debate
Ruben Bisi também fez ressalvas ao uso da expressão “tarifa zero” para descrever a política de gratuidade no transporte. Para ele, o termo pode induzir a uma interpretação equivocada, uma vez que, na prática, o custo do serviço continua existindo e precisa ser financiado por alguma fonte.
Segundo o dirigente, atualmente 245 municípios aportam recursos nos sistemas de transporte coletivo, enquanto 170 cidades adotaram o modelo de tarifa zero. Em média, os subsídios cobrem 64% do custo das operações.
Bisi defende que o foco do debate seja a chamada modicidade tarifária, associada ao custeio público de gratuidades e à entrada da União no financiamento do transporte urbano, em vez da adoção indiscriminada da gratuidade total. Ele alertou que a falta de fontes estáveis de recursos pode comprometer a sustentabilidade dos sistemas no médio e no longo prazo.
Transição energética e renovação de frota
A agenda tecnológica também ganhou espaço nas avaliações do setor. Além dos ônibus elétricos, estão em debate soluções como biometano, etanol, gás natural, hidrogênio verde e veículos híbridos. A entidade entende que o Brasil possui diversidade energética suficiente para adotar diferentes modelos regionais de descarbonização e que as decisões devem levar em conta custos, infraestrutura e segurança no abastecimento.
Outro tema sensível é a renovação veicular. O setor trabalha em uma proposta para retirada de circulação de veículos com mais de 20 anos, com potencial de estimular toda a cadeia produtiva.
Defesa da indústria nacional
A crescente presença de veículos e equipamentos importados, especialmente da China, foi outro ponto citado como preocupação. Bisi informou que fabricantes e entidades do setor discutem propostas para ampliar exigências de conteúdo nacional, elevar margens de preferência nas compras públicas e restringir o uso de recursos públicos para aquisição de produtos importados. Nesse contexto, está em organização uma frente ampla envolvendo fabricantes, sindicatos e entidades setoriais para defender políticas industriais voltadas à proteção da produção nacional.
Resultado positivo em ambiente de pressão
Mesmo abaixo da projeção inicial, os dados indicam que o setor encerra 2025 com crescimento, sustentado principalmente pela exportação e por políticas públicas em curso. Para 2026, as estimativas ainda variam entre estabilidade e leve retração em alguns segmentos, mas a necessidade de renovação da frota urbana e a compra de ônibus escolares sinalizam manutenção da atividade.
Outros segmentos, conjuntura e Inteligência Artificial
Realizado na sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), o Seminário do Simefre foi conduzido pelo presidente da entidade, José Antonio Fernandes Martins. Na parte final dos trabalhos, o encontro recebeu a visita de Paulo Skaf, presidente eleito pela quinta vez para dirigir a Fiesp, e que assumirá o cargo em janeiro.
Além da exposição de Ruben Bisi, sobre o segmento de ônibus, houve relatos dos diferentes segmentos vinculados ao Simefre. No setor ferroviário de cargas, o relato foi de expansão na produção e nas entregas. Foram informadas a fabricação e a entrega de aproximadamente 1.700 vagões em 2025, o que representa crescimento de 10% em relação ao ano anterior. No mesmo período, as entregas de locomotivas avançaram de 54 para 66 unidades, uma alta de 22%, indicando retomada dos investimentos e recomposição gradual da frota nacional. O setor ferroviário de passageiros relatou que foram entregues 122 carros ferroviários em 2025.
Para 2026, a projeção referentes aos dois segmentos do setor industrial ferroviário indica a entrega de cerca de 1.900 vagões de carga, 72 locomotivas e 193 carros de passageiros, com novos contratos tanto no mercado interno quanto externo.
Na área de implementos rodoviários, o setor de implementos pesados registrou retração próxima de 20% nas vendas entre janeiro e outubro de 2025, em comparação com o mesmo período de 2024. Já o segmento de implementos leves apresentou comportamento menos negativo, mas ainda sem conseguir retomar os volumes observados no ano anterior.
O setor de motocicletas mostrou que a demanda permanece em trajetória de crescimento, sustentando a produção de 2025 em patamar elevado: 1,95 milhão de unidades, crescimento de 11,5% sobre o ano anterior. O setor de bicicletas informou que após anos de oscilação, a produção nacional voltou a acelerar e registra alta consistente na comparação com 2024, acompanhada por maior dinamismo nas vendas e no emprego industrial.
Conjuntura e IA
O encontro do Simefre teve uma apresentação sobre o tema das relações trabalhistas, a cargo do professor Antônio Lúcio Molognoni, e as conferências do economista Antônio Lanzana sobre projeções do cenário econômico, e do cientista político Christian Lohbauer, que igualmente examinou as perspectivas quanto à economia, além da política interna e da situação geopolítica. O engenheiro Felipe Batista, diretor de novos negócios da empresa Adapta, fez uma exposição sobre o uso da Inteligência Artificial (IA), com exemplos específicos para o setor de transportes.
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